domingo, 22 de setembro de 2024

"VIAGEM PELO TEMPO", por Joaquim Pinto (8)


FREAMUNDE/PAÇOS - "DERBYS" ETERNOS (5)

ÉPOCA 58/59



De novo os "derbys".
Quis o destino do sorteio que logo no primeiro jogo os "azuis e brancos" se batessem com o mais complicado de todos os adversários, o "vizinho" grupo do Vasco da Gama, e logo em sua casa.
O campeonato mantinha o modelo habitual: os cinco primeiros da fase inicial ficavam apurados para a discussão do título e da subida (o Freamunde viria a sagrar-se campeão distrital); os restantes cinco clubes (Vasco da Gama incluído) iriam tentar a salvação. A descida estava destinada aos dois piores classificados nesta série, vencida pelos Vasquinhos que assim se safaram da despromoção.
Era evidente o desejo de vencer, estampado no rosto dos atletas que vestiam a cor do céu.
A euforia atingia o climax porque todos sentiam que a equipa possuía estofo de campeã.
O adversário, contudo, não era de terceira apanha. Subestimá-lo seria um perigo.

Sob arbitragem de António Magalhães, do Porto, as equipas apresentaram-se com a seguinte constituição:

Vasco da Gama: Ramos I, Laurindo, Pincho e Balé; Rola e Chico; Arménio Albertino, Ramos II, Júlio e Luís.
Treinador: A. Gomes (ex:Almada)


Vasco da Gama:

Em cima: Serafim (Massagista), Zé, Francisco I, Rola, Martinho, Vilaverde e Laurindo

Em baixo: Toninho, Teixeira, Ramos, Mota e Júlio
Fonte: Livro F.C. Paços Ferreira - 50 anos de história

Freamunde: Quintela, Alberto "Mirra", Barbosa e Luís "Mirra"; António Rego e Luís "do Cô"; Arnaldo, Ivo, Taipa, Humberto e José Maria "do Talho".
Treinador: Osvaldo Cambalacho


Sport Clube Freamunde

Em cima: Lopes, Alberto "Mirra", Barbosa, Zé Manel, Luís "Mirra", António Rego e Quintela

Em baixo: Arnaldo, Ivo, Humberto, João Taipa e José Maria "do Talho".

A lotação da "Cavada" estava esgotada. O campo transbordava de gente. Outra coisa não seria de esperar.
O jogo decorreu sempre em ambiente apaixonadíssimo.
No entanto, o desafio não teve o fulgor nem a beleza técnica que se exigia.




«Os golos do triunfo (2-1) foram surgindo naturalmente - contou-me certo dia João Taipa. 
Eu, por exemplo, tive sempre a predilecção por marcar ao Vasco  e este jogo não fugiu à regra. Os dois tentos foram da minha autoria (Ramos II marcou para os anfitriões) mas o que contou foi mesmo o triunfo, alcançado com o esforço de todos».
Portanto, à compita com o "Vasquinho", tudo na mesma... vitória, sempre vitória... para mágoa dos "doentes" da bola da sede do concelho.


XXX

Freamunde, Vila, estava ansiosa pelo jogo que marcava o início da segunda volta: Freamunde/Vasco da Gama.
Nas ruas, nas tabernas, nos cafés, não se falava de outra coisa.
O desafio trazia de novo a emoção ao "Carvalhal" que apresentou casa cheia para conforto dos cofres do clube.

Formação dos "onzes":

Freamunde: Quintela; Alberto "Mirra" e Barbosa; António Rego, Zé Manel e Luís "Mirra"; Luís "do Cô", Ivo, João Taipa, Humberto e Arnaldo.

Vasco da Gama: Ramos; Phalempin e Abílio; Rola, Laurindo e Chico; Luís, Arménio, Pinto, Ferreira e Júlio.
Marcadores: Humberto (2), Barbosa (2), Ferreira e Pinto.

Querendo vingar a "desfeita" da primeira volta, o "Vasquinho", que mobilizou muitos adeptos, aproveitou momentos de desnorte e preocupação dos locais para lograr vantagem no marcador (2-1) - Humberto tinha aberto o activo -, marca com que se atingiu o intervalo.
Barbosa, vítima de queda mal a procissão ia no adro, acabaria por fracturar o antebraço direito, sendo obrigado a receber, durante largos minutos, assistência médica fora das quatro linhas.
Ao abandonar o campo de semblante carregado, Barbosa não escondia o seu desalento.
Após o descanso a feição do encontro mudou radicalmente.
O Vasco tinha dado água pela barba obrigando o "capão" a levantar a crista.
Atrevidos, e já de novo com Barbosa, de braço ao peito, em campo (que exemplo de abnegação!) - atirado para a extrema esquerda apenas e só, ao que todos pensavam, para fazer figura de corpo presente -, os "azuis" entraram pressionantes, bastando dois minutos para que Humberto restabelecesse a igualdade. Ainda os apaixonados davam largas à sua alegria e Barbosa, a passe de Arnaldo, batia pela terceira vez o desafortunado guarda redes adversário.
Em menos de cinco minutos, um autêntico furação varrera o campo.
Afinavam-se de novo as gargantas. O "Carvalhal" rejubilava. Vivia-se um clima de enorme euforia.
Depois do "susto" voltavam as jogadas de arregalar o olho, protagonizadas por equipa serena e firme, a rubricar um futebol mecanizado, atlético e disciplinado, não estranhando que o "aleijado" Barbosa bisasse, carimbando em definitivo o selo da vitória. Agora, sim. Este já era o verdadeiro Freamunde. Foi tão grande o seu esforço, tão intensa a sua vontade de vencer, que só por mero acaso o adversário se salvou duma derrota por números mais expressivos.



Fernando Leal, o vice/presidente, a certa altura recordou com saudade e emoção: «Olhe, meu caro amigo, eu sabia, eu tinha fé, que os bravos rapazes não se deixariam vencer pela adversidade. A reacção dos nossos jovens na segunda parte representou um dos espectáculos mais belos que o futebol nos pôde proporcionar.
Tem piada que alguém, no final, numa mescla de ironia e júbilo, desabafou: "Foi um filme já visto com guião conhecido: vitória suada, sofrida, vivida com frenesim e angústia, sim senhor, mas... vitória. Como sempre"».
Ah! Desta feita, mesmo sobressaindo a sua classe e experiência, pondo calma e ordem na vivacidade contrária, João Taipa não marcou.
Barbosa acabaria por ser o "herói" da partida. Dois golos apontados com o braço fracturado amarrado ao peito, nem ao diabo lembrava.


Um comentário:

  1. Lembro-me bem deste jogo. Era puto - dez anos - e o bichinho pelo futebol já me corroía. Também em Freamunde nesse tempo não havia outra diversão. Era futebol e mais futebol. De manhã juniores à tarde seniores. Pelo meio eram as peladas entre os putos no campo da feira no lugar da Feira. Faz bem lembrar estes tempos idos.

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