Continuação:
Alexandrino Chaves Velho tinha conseguido manter o elenco anterior, juntar jovens freamundenses a despontar para o teatro, a pisar as tábuas pela primeira vez - membros, sobretudo, da mais fina nobreza daquele tempo, as pessoas cultas - para uma experiência inédita, sem subsídios de qualquer espécie, cremos, sem ajudas que não fossem as de alguns amigos.
Crónicas da época relatam que a estreia foi por demais auspiciosa, daí os constantes elogios. A peça tinha sentimento, tinha espírito.
No Jornal de Paços de Ferreira - Janeiro de 1898 - pode ler-se: «Foi posto em cena, no Teatro S. José, em Freamunde, o drama "Ernesto , o Enjeitado" ou " O Botão de Punho", da autoria de Alexandrino Chaves Velho. No final da 1ª apresentação, o Dr. Luís Alves Pinheiro Torres (Presidente da Câmara) e o professor Ilydio Gomes da Costa Torres, ofereceram ao autor dois ramos de flores».
Em Fevereiro, dia 7, desse ano, a "companhia" entrou em digressão; no Salão Nobre da Assembleia Lousadense, «perante concorrência selecta e numerosa, foi representado o drama, "Ernesto, o Enjeitado", em benefício da ASMF».
O dinheiro de bilheteira ultrapassou largamente as expectativas. Foram passadas 280 senhas de ingresso a 500 réis cada uma.
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Assembleia Lousadense |
Não podia, contudo, ser um teatro fino, colorido...! Não existiam, seguramente, cenários iluminados a luz de "acetylene" e a declamação de gesto e tom altissonante. Não se olhava às qualidades, aos dotes, porque isso seria tarefa quase impossível; às habilitações, sim, numa terra com uma enorme taxa de analfabetismo (70%) onde metade da população (1.500 habitantes, aproximadamente, que se dedicavam quase em exclusivo ao cultivo dos campos. As condições de vida do "Povo" impedia-os de tirar proveito da cultura) tinha menos de 19 anos (42%) e grassava a pobreza extrema na maioria dos cerca de 380 fogos existentes. Apelava-se à caridade, passando-se atestados de indigência. Valorizou-se essencialmente, a ocasião histórica.
Confessando a nossa ignorância, não acreditamos, mesmo, que se tivessem estipulado normas de funcionamento, elaborado programas de trabalho ou se definissem funções sociais do grupo; tomou-se por base alguns conhecimentos técnicos da matéria, adquiridos por Alexandrino Chaves Velho. Pretendia-se, isso sim, constituir um grupo social cujo ideal seria o culto da amizade, fraternidade e confraternização entre as famílias.
Tornou-se então evidente o desejo de conceder a Freamunde uma vasta, confortável e elegante casa de espectáculos; de pôr a funcionar uma sala com comodidades para proveito recreativo e cultural da população. Aproveitaram o salão da recém criada Associação dos Socorros Mútuos Freamundense, espaço construído com esforço, amor e entusiasmo, com o músculo e cérebro dos seus associados. Prédio traçado com beleza e amplitude, obra dispendiosa para a época.
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Associação Socorros Mútuos Freamundense |
Para remate da casa, Alexandrino Chaves Velho - por muitos considerado o "esteio" da ASMF - tornou-se, com a verba de dez mil réis, um dos capitalistas subscritores. Foi, pois, e é ainda, importantíssima a mesma, já não pela originalidade das linhas arquitectónicas, pela grandeza que presidiu à sua concepção, mas porque a ela está intimamente ligada quase toda a parte da história brilhante do teatro em Freamunde. Uma casa de espectáculos, verdadeiramente interessante. No mundo da arte, lá há perpassado muito do que melhor havia na cena lírica, na música e no dramático. A sala era, então, pintada a branco, com a plateia recheada de cadeiras em madeira. Uma sala "chic" para a época onde evoluíram muitas "celebridades" locais e se representaram comédias hilariantes, dramas de terna emoção; serões deliciosos, duma enorme plêiade de "artistas" que ao longo de todo este tempo têm sido o nosso orgulho.
Continua:
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