Continuação:
Com o decreto que designava o Domingo para o dia de descanso, é lícito concluir que o interesse do público pelo teatro terá aumentado.
A época de 1908, para muitos, foi de tristeza e inquietação com o Regicídio. D. Carlos tinha sido vítima das atrocidades políticas, há muito condenadas por pessoas ilustres, elementos de incontestável classe.
O movimento teatral continuava quase parado. Só por alturas do Natal e Páscoa se realizavam os autos, de sabor estritamente popular: Paixão de Cristo, vidas de Santos, passagens edificantes da doutrina cristã...
Conforme referem os jornais "Progresso de Paços de Ferreira" e o "Jornal de Lousada", «nos dias 12 de Junho e 10 de Julho de 1910 - dia da grande festa ao Mártir S. Sebastião - (ainda no período monárquico do Rei D. Manuel II), foi levado à cena, na ASMF, primeiro, e depois num barracão construído na Rua do Commercio, o drama sacro "O Nascimento do Messias", ou "A Dança do Menino", como impropriamente lhe chamam, sob orientação de José Pinto Pereira Gomes "Zezinho da Casimira.
As casas tornaram-se pequenas para as enchentes registadas».
Por cá, entretendo o público, havia aparecido o cinematógrafo, vindo de S. Miguel das Aves, sob a direcção do célebre "Rijão", onde, na ASMF, «eram projectadas lindas e variadas fitas».
Logo que a República foi proclamada (5 de Outubro de 1910), foi nomeada uma comissão para estudar as causas da decadência do teatro português e respectivas reformas.
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Implantação da República |
O "povo" não ia ao teatro porque dele estava completamente divorciado devido a uma ignorância atroz. Era, no entanto, necessário que alguma coisa mudasse.
A partir de então, e com o decorrer do tempo, a arte de representar passou a ser heterogénea, reunindo grandes e pequenos, instruídos e analfabetos, estudantes, comerciantes, industriais, operários, gente do campo...
Já com a Constituição da República aprovada, Henrique de Vasconcelos (1º Presidente da Junta da Paróquia após a queda da Monarquia) retoma os ensaios da "Troupe Dramática" e leva à cena as comédias: "Se Eu Fosse Rapaz", "Aninhas e Zé da Horta" e "Um Beijo Roubado".
Laura Silva, Brasina Gomes e António Joaquim Ribeiro eram as "vedetas" de então. A exigente missão de caracterizador foi entregue a Fernando de Sousa Ribeiro, estando a orquestra (instrumentos de cordas) confiada, como sempre, ao distinto maestro Augusto Pereira Gomes.
Durante dois anos, não se abriram as portas ao público. Grassou o flagelo da febre tifoide, sendo, para além de outras medidas tomadas, (como, por exemplo, fechadas as duas fontes existentes), encerrados os lugares de reunião e convívio.
Outra das causas, que tornou impróprio o ambiente nesta freguesia, foi a promulgação da Lei da Separação da Igreja do Estado. Tal facto fez erguerem-se imediatamente os protestos do clero (Em Freamunde o padre João da Cunha Lima revelava-se principal contestatário), ocorrendo conspirações e rebeliões do episcopado português por todo o país.
Mesmo assim, numa das páginas do "Jornal de Lousada", pelo correspondente em Freamunde, Ilydio Torres, descortinamos uma referência interessante relativa a teatro, sobre uma Companhia contratada para colmatar o "descanso" a que a "Troupe Dramática de Freamunde" fora forçada: «A Companhia Correia Peixoto, apenas composta de dois elementos, além de ter debutado nos principais Theatros dos grandes centros, vem dar um espectáculo, no salão da ASMF, no dia 25 de Dezembro de 1913, dia de Natal, lavando à scena o deslumbrante drama "O Divórcio"».
O certo é que a actividade teatral ressurgiu em força no ano de 1914. Fruto da resignação do clero, e também da própria consolidação da República, viveu-se a partir daqui uma certa acalmia nas relações entre o Estado e a Igreja. O teatro era um espectáculo necessário para o público... E já para algum "povo". Era uma festa, um divertimento de princípio ao fim, fiasco que fosse.
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Albertina Peixoto |
Disso fez eco o jornal "Progresso de Paços de Ferreira", numa das suas edições: «No dia 17 de Maio de 1914, no elegante salão da benemérita ASMF, a "Troupe de Amadores Dramáticos de Freamunde", agora, e de novo, sob a direcção artística de José Pinto Pereira Gomes "Zezinho da Casimira", ofereceu à população um interessante serão. Três chistosas comédias em 1 acto; "Um Noivo de Encomenda", "Uma Orquestra Em Família" e o hilariante monólogo, "Paio Pires da Costa".
A neófita actriz, Albertina Peixoto (Foi-nos dito, recentemente, tratar-se da mãe de Agostinho "Salvé-Rainha"), fina, atraente, muito elegante, esteve irrepreensível, interpretando admiravelmente o seu papel.
A reacção foi enérgica e os aplausos entusiásticos a todos os actores fizeram-se ouvir.
Ao hábil ensaiador da Arte de Talma, "Zezinho da Casimira", as mais calorosas felicitações.
A sala estava a abarrotar, vendo-se tudo quanto há de "chic", não só desta terra como de freguesias circunvizinhas (Estamos a imaginar as ilustres "madames", penteadas e vestidas como para uma festa, limpando, à entrada da Associação, os pés já sujos do pó e da lama dos caminhos).
Noutro âmbito, o concerto dado, no palco, por um grupo de músicos da apreciada Banda Freamundense, com regência de António Ferreira Nunes, que executaram temas da revista "Capote e Lenço", esteve esplêndido, pedindo-se bis.
Para o feliz êxito muito contribuíram os senhores Dr. Alberto Cruz, Adolfo Leão, Henrique de Vasconcelos e Arnaldo Cruz».
Continua:
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